Processadores
Segmentação do Mercado

A Venda de processadores Intel Celeron por preços ridiculamente baixos não caracteriza "dumping"? Porque algumas pessoas dizem que o o Celeron 400 e o 300A são na essência a mesma coisa? Se isso fosse verdade não seria melhor vender todos como 400?

O custo variável para a produção de um processador é ridiculamente baixo, é evidente que não conheço a planilha de custos da Intel mas o custo variável marginal de um processador Celeron deve estar na casa dos 40 ou 50 Dólares, o de um PII 400 com certeza é um pouco, mas não muito, mais alto, já que o conjunto tem alguns chips a mais: Os do cachê L2. De qualquer maneira a maior parte dos custos envolvidos são amortizações do diferido gerado: Bens de capital e, principalmente, pesquisa e desenvolvimento. Como vê uma ação de "dumping" neste caso é complexa, é necessário um estudo completo não só da planilha de custos como da escala, segmentação do mercado e vida útil prevista do produto, pois daí deduz-se o prazo a amortizar o diferido. Ainda que um produto esteja sendo vendido com prejuízo, desde que o seu preço supere apenas o custo variável muitas vezes não é caracterizado o "dumping", principalmente se a venda deste produzir economia de escala suficiente para a colocação de um outro produto da mesma família no mercado e, este sim, estar gerando resultados positivos para toda a linha.

Não vou trabalhar com funções para ser sintético, para simplificar ao máximo te darei um exemplo numérico discreto.

Suponhamos que um determinado fabricante está desenvolvendo um produto e seu estudo de mercado concluiu que, durante a vida útil deste (6 meses), o mercado terá condições de absorver 3 milhões de unidades deste bem segmentados da seguinte forma:

- 500.000 unidades poderão ser colocadas por $ 500 (250 milhões);
- 1.000.000 unidades poderão ser colocadas por $ 300 (300 milhões);
- 1.500.000 poderão ser vendidas por $ 100, (150 milhões); junto aos consumidores menos abastados.

Sendo, então, a despesa potencial total do mercado comprador para esta linha de produtos no valor de $ 700 milhões.

Suponhamos agora que foram gastos em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) 300 milhões e que outros 200 milhões foram gastos com a montagem da linha de produção do bem. Suponhamos ainda que o custo variável marginal é fixo em $50. Assim, a produção inicia-se com $500 milhões de despesas a serem amortizadas ( $200 de máquinas + $300 de P&D ), se esta empresa tentar vender todos os bens produzidos a $500, somente 500.000 unidades serão vendidas, como vimos no estudo de mercado, auferindo a receita de $ 250 milhões, tendo, portanto, um prejuízo de $ 275 milhões:

- 250 milhões de receita
- (500) milhões de P&D + Máquinas
- (25) milhões de custo variável (500.000 x $50 = $ 25 milhões)

Resultando em prejuízo de $ 275 milhões, o custo médio de cada peça teria sido de $ 1.050 ( 525 milhões / 500 mil).

Se esta empresa tivesse colocado no mercado seus produtos ao preço de $300, 1.500.000 peças poderiam ser produzidas e vendidas, como vimos no estudo de mercado ( 1 milhão para o público que pode comprar a 300 mais 500 mil para aqueles que poderiam comprar por mais e, obviamente, vão comprar por $300).

A receita total seria de $450 milhões ( 1.500.000 x $300) e o prejuízo seria de $ 125 milhões ($450- $500- $75) já que cada peça é produzida ao custo variável de $50 e 1.500.000 x $50= $ 75 milhões.

Qual seria a solução então? Vender este produto por $ 500 para quem pode pagar este preço e por $300 para quem pode pagar este último. Acontece que ninguém vai comprar por 500 um bem que pode comprar por 300, por mais rico que seja, assim a empresa divide o produto em duas "marcas": A marca 233 e a marca 200, a "marca" 233 custará $500 enquanto a "marca" 200 custará $300. Isto posto, a empresa aumentaria suas receitas, pois poderia vender 500 mil unidades a $500 e 1 milhão a $300 (como vimos no estudo de mercado), logo as receitas totais seriam de $550 milhões (500 mil x $500 + 1 milhão x $300), mas aida assim haveria prejuízo pois o custo de produção de 1.500.000 unidades do bem seria de 575 milhões ( $500 de P&D e máquinas + $75 de custo variável).

Como sair do prejuízo? Se esta empresa produzir e vender os 3 milhões de peças que o mercado pode absorver o resultado seria positivo? Vejamos qual seria o custo médio:

500 milhões de P&D e Máquinas + 150 milhões de custos variáveis ( $ 50 por peça x 3 milhões). Logo cada peça produzida custaria 650 milhões / 3 milhões = $ 217. "Ora, não interessa vender para os outros 1,5 milhão de "pobres" que somente podem pagar $100 na nossa peça se ela custa para nós $217!" Exclamou o "esperto" diretor financeiro Belaveta. Será mesmo que não? Vejamos:

Pra vender para os "pobres" por $ 100 a empresa criou mais uma marca, a marca 166, assim o mesmo produto era vendido com a marca 233 para os "ricos" por $500, a marca 200, para os "remediados", por $ 300 e a marca 166, que atenderia ao público mais "pobre" ou menos exigente que seria vendida por $100. Assim, como vimos do estudo de mercado, 500.000 peças 233 seriam vendidas por $500, 1 milhão seriam vendidas por $300 e 1,5 milhão $100 ( é claro que no mundo real sempre existirão aqueles que podem pagar pelo mais caro mas optarão pelo mais barato, mas o modelo é simples, embora retrate, em linhas gerais, o que de fato ocorre).

Desta forma a receita total da empresa com estes produtos seria de $700 milhões enquanto que os custos totais seriam de 650 milhões ( como vimos no parágrafo anterior) e o custo de cada unidade produzida de $217 (como tb vimos (650/3) ). Agora o lucro da empresa é de $ 50 milhões, o que dá aroximadamente 8% do capital investido, supondo que ele tenha sido próprio e que estas vendas tenham ocorrido em 6 meses ( vida do produto), equivaleria a um retorno anual de 17% sobre o capital investido!!! Um resultado excepcional que faria as ações desta empresa dispararem em bolsa.

Mas como a venda por $100 a unidade de 1,5 milhão de peças que custam $217 cada, para serem produzidas levaram a empresa do prejuízo ao lucro??? Economia de escala, embora o prejuízo por unidade em cada uma dessas 1,5 milhão de peças tenha sido de $117 foi graça à colocação destas peças no mercado que o custo médio baixou para $217 permitindo lucro nas duas outras "marcas" que mais do que compensaram o resultado negativo com esta.

Esta "marca", a 166, foi vendida com um significativo prejuízo por unidade, isto é "dumping"? NÃO! Não é, pois foram estas vendas com prejuízo que garantiram economia de escala necessária para a empresa obter resultado positivo.

Pelo exposto acima fica evidente que, caso a vida útil do produto em questão seja prolongada para além do período de amortização dos investimentos em P&D e em aquisição de bens de capital (maquinaria), fica viabilizada a colocação deste no mercado por apenas uma pequena fração do preço inicial. A título de exemplificação suponhamos que um determinado chip tenha a previsão de amortizar os citados custos fixos em 3 milhões de unidades e que estes custos signifiquem 80 UM (unidades monetárias) por unidade, sendo os custos variáveis de produção da ordem de 30 UM, assim durante os primeiros três milhões de unidades vendidas o preço médio a ser auferido por este chip deverá ser superior a 110 UM para que a empresa pudesse obter resultado positivo. Acontece que após as vendas de três milhões de peças esta empresa percebe que ainda há demanda para este chip se ele for ofertado por um preço significativamente inferior, prolongando a permanência do produto no mercado, perceba, no entanto, que agora o custo fixo de 80 UM por peça NÃO existe mais, pois já foram completamente amortizados com as vendas dos primeiros 3 milhões, assim o custo por unidade produzida é agora de apenas 30 UM, o que possibilita a colocação deste chip no mercado por qualquer importância acima ou até mesmo igual a 30 UM (muitas vezes é mais importante preservar ou ampliar a fatia de mercado do que obter resultados imediatos) , repare que um chip que meses antes teria que estar sendo distribuído por pelo mais de 110 UM para trazer resultados positivos, agora pode ser comercializado por apenas 27% do preço inicial (o que equivale a um recuo de 83% ). É por este motivo que, por exemplo, placas como a Viper V.330 que no início de 1998 era vendida por 200 Dólares americanos, no sítio do próprio fabricante, agora pode ser encontrada por ¼ desta importância.

OBS: Este texto visa público não especializado, portanto trata-se de um forte esforço de simplificação, inúmeros detalhes técnicos foram propositadamente omitidos a fim de facilitar ao máximo a compreensão dos elementos básicos do arcabouço lógico do processo de formação de preços, sob a ótica do produtor, em mercados com características de concorrência monopolística.

Aurélio



Hard&Cia - 2001
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